sábado, janeiro 01, 2011

A Cura

Clarice acordou triste. Dormiu com soluços e lágrimas e amanheceu com uma vontade de não se levantar da cama. Porque afinal amanheceu, porque insiste em seguir seu curso? O sol irritantemente brilha no lado de fora da janela e Clarice sente náusea. Está cansada, a luta não lhe parece justa, as armas são distribuídas de forma desigual.

Clarice sentiu vontade de chorar de novo, de correr para longe, nem ela mesma sabe para onde. Queria fugir pra longe nem sabia de que, para longe dela mesma. Não sabe nem mesmo o que está sentindo, só queria que a angústia passasse. Tem tudo medo, tem tido dúvidas que não queria ter, tem pensado coisas que não queria, tem tido sentimentos que nem sabia que existia. De onde vem essa sensação de vazio, de que tudo está mais difícil do que é e mais complicado do que se mostra? De onde vem essa sensação de que tudo está perdido, essa desesperança, essa falta de tudo?

Clarice se levanta, olha de novo o sol, levanta-se com muito custo. Veste uma roupa sem se preocupar com o que está vestindo e sai desanimada. O dia está igual a todos os outros dias. Não há flores novas e nem cores diferentes. Nada além da vida de sempre. Clarice vê seu ônibus, dá sinal e senta-se com má vontade. 

- Dia difícil? - Ela se vira com uma ponta de raiva pela intromissão. A seu lado, um rapaz, com olhos de madeira, pele clara e rosto redondo sorri sem jeito. - O meu tem sido ruim também. Aliás, a semana não foi nada boa. Eu me chamo Ângelo. - Clarice pensou em não responder, mas de repente parou a olhar aqueles olhos. Era como se eles sempre fizessem parte da sua vida, como fossem velhos amigos. A única coisa que conseguiu fazer foi sorrir. Ângelo continuava a olhar Clarice. Sua pele morena, seus olhos verdes e olhar triste. Sentia vontade de colocá-la no colo, não sabia bem o porquê. Parecia uma menina indefesa. Continuou a conversa sem saber como fazer. 

- Você pega sempre esse ônibus? Qual é mesmo o seu nome?

- Clarice. Sim, pego o ônibus todos os dias para trabalhar. O meu dia começou ruim também, aliás, ontem já foi ruim e nem mesmo sei o porquê. A vida não tem tido graça.

- De repente a gente que se esqueceu de achar graça na vida! Bom, desço daqui a dois pontos. Eu trabalho em uma loja de flores aqui perto, brinco que vendo mais que flores, vendo sonhos. Aqui está meu cartão, se precisar. De repente podíamos tomar um café no fim do dia. Bom... Até um dia.

O dia passou como todos os dias passam, mas não como todos os dias para Clarice. Esse correu entre os pensamentos dela, voou nos olhos cor de madeira. De repente Clarice parou o ônibus fora de seu ponto habitual. Desceu, virou a rua e entrou em uma pequena porta. Foi recebida com um sorriso. 

- Pois não, posso ajudar?

- Sim, estou precisando de alguns sonhos, podem ser vermelhos, e a propósito, o café está esfriando no Café da esquina.

- Claro senhorita, um sonho novo sempre é bom. Fecho as portas em dois minutos.

Assim Clarice saiu com seus sonhos e seus dias deixaram de ser iguais. Havia medos, mas havia coragem, havia dúvidas, mas também havia muitas certezas. O amor transforma o mundo e definitivamente, a vida inteira.

2 comentários:

  1. Encantada com o texto. Dá uma enorme vontade de acreditar no amor.
    Beijos...
    Ah! E é verdade, é melhor aprender com o passado mesmo. :)

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  2. Lindo!!!!O amor ajuda muito,ele faz a vida ter cor,ter brilho!!Amar alguém é maravilhoso,mas ser amada é tão esplêndido que não há palavras para descrever!!

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