Todos os dias, religiosamente, Diana estava no ponto de ônibus perto de sua casa. No total, dava uns quinze minutos andando da saída do cortiço onde morava até o local, mais ou menos seis músicas na sua conta. Dois pequenos pontos, inseparáveis, sempre estavam conectados em suas orelhas. Seus fones de ouvido ligavam ao celular, que exaustivamente reproduziam músicas diversas. Ela optava pela música internacional, afinal estava sempre antenada no mundo. Internet, redes sociais, MSN, Orkut, tudo isto é a vida de Dih, como a própria prefere ser chamada em seu ‘universo virtual particular’. Seguia para a escola com os fones no ouvido. Não escutava as buzinas dos carros, o ronco das motocicletas, muito menos os latidos dos cachorros, o miado dos gatos, o som do vento farfalhando as folhas da árvore, nada. Preferia ditar sua própria trilha sonora, amparada pela tecnologia. Achava que, com aquele aparelhinho minúsculo, sua vida poderia ser como nos filmes – com música própria para cada momento.
Diariamente, sem pestanejar, estava Diana no local. Não olhava para os lados, não ouvia ou via a conversa dos outros. Fechava-se dentro de seu próprio universo moldado pela sua música e pelos seus fones. Tecnologia, ó doce tecnologia. Certo dia, entretanto, suas baterias lhe traíram e o celular apagou assim que chegou ao ponto. Não dava tempo para voltar até sua casa, muito menos tinha uma reserva. Sem bateria, lhe restou, a contragosto, se ‘desplugar’ de seu mundinho e escutar as buzinas dos carros, o ronco das motocicletas, os latidos dos cachorros, o miado dos gatos, o som do vento farfalhando as folhas da árvore. Agora tudo estava ali, como uma inundação de novos sons. Como um novo mundo. Acabara ela de pisar em um outro planeta?
O ônibus já parava no ponto e ela quase tomou um susto com o som do freio que não funcionava direito e com o ressoar da fumaça escapando pela descarga. Surpresa, Diana era devorada por uma realidade da qual esteve alheia a muito tempo. Viu a conversa das pessoas, seus sorrisos e suas preocupações. Sentou-se no último banco, num único lugar vago. Ao seu lado, um rapaz de olhos negros como a noite e de farto sorriso resolveu falar:
- Olá, eu me chamo Ezequiel.
- Dih... – travou, num instante, ao pensar que ele poderia rir de seu apelido virtual. - ... sou a Diana.
- Poxa, muito prazer... - Respondeu o rapaz. - ... Diana. Sabe, todos os dias eu te vejo pegando este ônibus, mas você sempre está com uns fones no ouvido e parece sempre no mundo da lua. Há tempos queria te conhecer, felizmente hoje você está sem eles!
Pela primeira vez, Dih abriu espaço para a Diana. E sem os fones e sendo ela mesma, teve o prazer de conhecer alguém no mundo real. Ezequiel foi apenas o seu primeiro amigo, depois dele vieram outros. Aliás, Ezequiel não só foi seu amigo, mas também se tornou seu namorado algum tempo mais tarde. Depois de um dia ‘fora do ar’ e longe dos seus fones, Diana realmente soube o que é... estar viva.
Acesse o seu mundo. Esteja conectado a vida.
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