Deitado na cama olhava o teto perdido em pensamentos. Voltara com essa antiga mania. Mania que às vezes incomodava aqueles que falavam sem parar com ele até se dá conta de que na realidade ele não estava ouvindo. Estava em outro mundo. Não! Em outra galáxia. Cruzou os braços abaixo da cabeça e continuou nessa posição durante alguns minutos até sentir uma leve dormência. Somente o som do silêncio se era possível ouvir.
- Não posso! Eu... Eu não consigo. Quem me dera poder. Eu queria poder sabe, mas não consigo. Sim, eu já tentei... Mas... Mas é como se...
O silencio finalmente fora quebrado. O som das palavras ainda ecoava pelo quarto. Um som triste, angustiante. Seus olhos marejaram. Seja por qual mundo ele estava naquele momento, a cena que se passava dentro de sua mente não era uma das mais perfeitas. Mudou de posição. Virou o rosto e olhou para o lado. Seus olhos bateram imediatamente em um recente livro que comprara e nem o lera ainda: “O Enigma”. Era assim que sua vida se resumia... Em um grande e estafante enigma de todas as coisas. Como um código que jamais pudesse ser descoberto. Estava farto disso tudo. Estava farto de ser o menino bonzinho. Estava farto dessa hipocrisia sem fim que o rodeava. Estava farto das pessoas. Estava farto do amor.
- Droga! Será que você não entende? Será que é tão difícil assim? ... Então me diz... Como... Como... É só o que te peço... Como...?
Falava como se ao seu lado houvesse outra pessoa com quem dialogava. Como se alguém o ouvisse e respondesse. Alguém que não existia ou ao menos que não pudéssemos ver. Sempre lhe disseram que nunca estava sozinho. Talvez naquele momento realmente não estivesse. Quem vai saber? Cerrou os olhos fazendo com que uma singela lágrima escorresse por seu rosto e fosse repousar no canto da boca. Era impossível saber o que se passava dentro daquela mente. Impossível penetrar suas defesas e investigar seus pensamentos. E nem nos cabe tal audácia. Depois do que pareceu uma hora ele voltou a abrir os olhos, levantou, apanhou um lápis e o seu caderno de anotações e pôs-se a escrever:
Você pode ir embora e nunca mais ser o mesmo. Você pode voltar e nada ser como antes. Você pode até ficar, pra que nada mude, mas aí é você que não vai se conformar com isso. Você pode sofrer por perder alguém. Você pode até lembrar com carinho ou orgulho de algum momento importante na sua vida: formatura, casamento, aprovação no vestibular ou a festa mais linda que já tenha ido.
Mas o que vai te fazer falta mesmo, o que vai doer bem fundo, é a saudade dos momentos simples: da sua mãe te chamando pra acordar, do seu pai te levando pela mão, dos desenhos animados com seu irmão ou irmã, do caminho pra casa com os amigos e a diversão natural, do cheiro que você sentia naquele abraço, da hora certinha em que ele sempre aparecia pra te ver, e como ele te olhava com aquela cara de coitado pra te derreter.
De qualquer forma, não se esqueça das seguintes verdades: Não faça nada que não te deixe em paz consigo mesmo; Cuidado com o que anda desabafando; Conte até três (tá certo, se precisar, conte mais); Antes só do que muito acompanhado; Esperar não significa inércia, muito menos desinteresse; Renunciar não quer dizer que não ame; Abrir mão não quer dizer que não queira.
O tempo ensina, mas não cura.
Colocou a caneta de lado e releu o que havia escrito. Havia resumido de forma única muitos assuntos de sua vida. Assuntos que só diziam respeito a ele. Sorriu. Agora se sentia melhor. Escrever sempre o libertava do peso que insistia em aparecer. Mas naquele dia, sentia que havia algo mais. Algo que seus olhos ainda escapavam. Fechou o caderno e foi dormir em paz ainda com as palavras escritas outrora na mente:
... Esperar não significa inércia, muito menos desinteresse; Renunciar não quer dizer que não ame; Abrir mão não quer dizer que não queira. O tempo ensina, mas não cura.
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